quarta-feira, 11 de maio de 2005

- Pais e filhos -

Estes personagens são fictícios. Qualquer semelhança desses fatos com a vida real é mera coincidência.

    Cheguei em casa correndo. Mal larguei minha pasta sobre a mesa da cozinha e já estava saindo novamente.
    Tomei o rumo para a pracinha aqui perto mas mesmo antes de alcançar a esquina, vi que ela a dobrava, com o rosto baixo e postura de quem perdeu a guerra.
    - Filha, perdoe o papai. Tive uma reunião de última hora com um cliente importante. Por isso não consegui chegar a tempo de ir encontrar com você na pracinha.
    A menina nem levanta a cabeça. Os cabelos lisos e dourados, tapam o rosto, escondendo o choro soluçante da pobre.
    - Vem cá, minha boneca. Eu sei que combinamos de eu te ensinar a andar de bicileta na nova que eu te dei, mas papai tinha outras responsabilidades. Você entende?
    O silêncio julga e condena.
    - O que houve com o seu joelho? Você caiu? Se machucou? Fala com o papai. Eu sei que você está triste comigo. Eu queria ter estado lá. Desculpe, querida. Queria ter podido impedir que você caísse.
    Movimentos leves revelaram aos poucos o rosto da menina, que sob a maquiagem da tristeza, revelava indignação. Então pela primeira vez, ela se dirigiu ao pai, com um olhar lancinante, de forma que as palavras ditas em seguida fossem cravar uma ferida permanente em quem ouvisse.
    - Não, pai. O problema não foi você não ter estado lá para me impedir de cair ou me machucar. Muitas vezes ainda, vou cair e cair até aprender. Eu só queria mesmo que você tivesse podido estar lá para me ver cair e levantar.

sábado, 7 de maio de 2005

- Tem algo estranho -

    Tô com uma sensação estranha mas não sei o que é. Tenho algumas suspeitas...
    Será que é essa gripe desde quinta-feira?
    Será que é porque eu estou puto por causa da empregada ter tentado limpar meu laptop com um perfex sujo de álcool e manchado o coitado?
    Será que é porque o dinheiro do meu cliente a ser depositado quatro dias atrás se perdeu?
    Será que é porque eu talvez tenha sido multado (de novo) na linha Amarela por estar novamente com a cabeça nas nuvens?
    Será que é porque estou tão sozinho que a única coisa que não me abandona é a pança?
    Será que é porque arranharam meu carro hoje na garagem do prédio?
    Será que é esse inverno que não chega nunca?
    Será que é a maldita Virtua que vive caindo nas horas de pico? (E quando eu ligo para o suporte para perturbar os caras, me oferecem um plano de velocidade maior. Aí eu respondo: "Amiguinho, se vocês não conseguem fazer esta merda funcionar devagar, imagina rapidinho.")
    Será que é porque estou ansioso para terminar esta bendita faculdade?
    Será que é porque eu estou enrolando para escrever a monografia?
    Ou será que é por causa da flutuação do dólar?
    O que será???

terça-feira, 3 de maio de 2005

- Pais e filhos -

    Filho, mãe e irmã saem para dar uma volta na praia a noite.
    Papo furado vai, papo vencido vem, sai uma coisa assim:
    - Sua irmã só me deu 4 horas de dores antes de nascer. Você me deu mais de 20 horas de dor. - diz a mãe.
    - É porque quando somos jovens sempre fazemos as coisas erradas mesmo. - responde o filho
    - Hã?
    - Criança só faz merda.
    - O que quer dizer?
    - Se eu tivesse a sabedoria e o conhecimento que eu tenho até este célebre momento com -20 horas de vida, eu esperava mais umas 48 horas.
    - E eu sentindo dor, né?
    - Ah! Você não é caça-fantasma mas pegou o espírito da coisa!
    - Nossa! Como você é amargo.
    - Até que eu fui bonzinho. Já pensou se eu espero até eu e minha irmã sermos gêmeos?
    - Não entendi.
    - Jura?
    - É, ué. Não entendo essas suas piadinhas.
    - Piadinhas? Vamos voltar correndo para casa.
    - Por que?
    - Quero ver se ainda consigo marcar um exame de DNA pra gente amanhã de manhã.

domingo, 1 de maio de 2005

- Sabedorias do espelho -

    Acho que não consigo confiar meus sentimentos à mais ninguém. Não que exista alguém a quem confiá-los agora, até porque nem sei se os sentimentos aos quais me refiro ainda existem. Mas ultimamente tenho sentido que dificilmente serei capaz de confiar numa garota sem ter medo do que vai acontecer depois de eu expor o que sinto. Sei que arriscar é preciso, mas já arrisquei tanto e por tantas vezes me dei mal. Não sei se quero correr o risco novamente.
    E está me ocorrendo há pouco tempo que talvez isso explique o meu comportamento dos últimos meses de total isolamento. Praticamente, só saio de casa para resolver compromissos obrigatórios, e praticamente nunca, exceto para manter as amizades antigas, saio para uma vida social.
    Parece que me expor, é estar propenso a sentir as tentações da vida e acabar me apaixonando de novo por aí. Ficar louco com a febre de uma paixão epidêmica e sair me declarando para qualquer uma Sersi que sorria ou seja simpática. Só até a fria lâmina da realidade partir meus hemisférios e me deixar tentando colar as partes sozinho.
    Realmente, não acho que estou mais propenso a sair da toca e ficar correndo riscos. Parece, até agora, muito confortável a situação de não ter que ficar sentindo saudades, medos e incertezas sobre alguém. Tem estado muito bom saber que a programação da TV a cabo continua razoavelmente interessante para me manter em casa e ficar cada dia mais impressionado com a eficiência dos Correios entregando todo o tipo de satisfação pessoal que meu cartão de crédito pode conseguir.
    A não ser que a agulha de minha bússola volte a apontar pra outro lugar que não meu sofá, estarei muito bem aqui mesmo de onde digito este post. E muito obrigado por perguntar.